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Desabafo


Eu falo muito,
mas tem coisas que eu não sei dizer.
Nem escrever às vezes.
Tem certas palavras que inevitavelmente se fazem escrever,
outras me fazem oscilar e
destroçado o racional eu procuro sem ver.
Eu não vejo o poste,
os carros,
só o vento nos cabelos...
rua abaixo predomina a respiração e
a decomposição dos meus sentidos.
Eu, rua abaixo não sinto o Sol,
submerso na cinza,
sou tragado a cada sentimento,
impossibilidade,
pensamento,
prisão...
Apesar de desconcertada a liberdade passa risonha,
voando sob minha cabeça abraçada a uma bola de canhão.
A minha cabeça emergida de um peito
cujo chão exaurido
faz sentir o contrato da saudade com a dor.
Ah! Mas eu? Eu nada!
Nem tão pouco tudo isso,
pois tudo isso são palavras.
Eu sou só uma dor,
andando sórdido e lento.
Entorpecido pelo tempo
venho medido pelo passado.
Eu, cortado fundo,
amado ralo...
Eu nem nada,
nem sopro,
nem poesia,
nem palavra.

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