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Mostrando postagens de janeiro, 2018

O Centauro e o Touro

Encarava-o. Seus olhos estavam tristes, marejados. Algo incomodava. - Mais vinho? - Obrigada. Sorrira sutilmente. Ele lhe sorria também, havia dor por trás dos maxilares quadrados, havia dor naqueles olhos. - Podíamos ter dado muito certo não? Éramos bons juntos... - Sim. Éramos... - Nunca faltou risada não é? - Fato. Ela era orgulhosa, difícil. Não permitia que ninguém a possuísse de verdade. Dava-se apenas aos despautérios de si mesma. Tinha medo naquela época. Hoje não mais, mas naquela época tivera muito medo. - Vamos falar de você... como você está? Tudo bem? - A medida do possível, sim. Ela mentia. Não estava bem, era inquieta embora não deixasse transparecer. - Nada a incomoda não é? - Algumas coisas me incomodam, mas nada me incomoda o suficiente para me tirar a paz. Você me parece incomodado. Quer que eu vá embora? - Não. Ele não queria. O que ele queria era uma máquina do tempo, que devolvesse seus cabelos longos e vivacidade, que devolvesse tamb

Nota sobre a maçã no incêndio

Girava na sua dança alucinada. Ela não fazia ideia, não sabia. Não estava ali. Havia um corpo com a alma tão livre que não coube. Estava fora da linha, das linhas, das regras. A boca mexia atirando ideias incompletas e confusas. Não media nem filtrava. Os passos eram desfigurados pela inconstância. Tanto lhe acompanhara a leveza e agora tudo pesava. Sumira de súbito. Estava confortável no escuro. Sentia as pernas tremerem. Espasmos tomavam-lhe o corpo. O dorso levantava suavemente e de repente contraía-se. Aquele calor... úmido. Fogo, cinzas... Cinza. A noite morria. Dia claro agredindo os olhos negros. Sem limites... Sem leme, sem rumo, barco a deriva. Tempestade. Umas chamas descontroladas ainda dominavam aqui e ali... Ela encarava o espelho... ainda sem saber quem é que estava encarando. Marcas de pequenos incêndios, cinzas de revoada... descompensada.